Valor em Primeiro Lugar: Compreender a Mudança de Foco no PMBOK 7 e sua Conexão com Agile

A gestão de projetos tem uma história longa e rica de constante evolução e adaptação às mudanças do ambiente empresarial. Uma das mais recentes e significativas mudanças ocorreu na sétima edição do Guia PMBOK, produzido pelo Project Management Institute (PMI). Essa mudança foi a alteração do principal paradigma em que assenta o modelo de gestão de projetos que passou a focar-se na criação de valor em em vez de se focar, como nas versões anteriores da metodologia, nos entregáveis do projeto. 

Este artigo irá explorar o que essa mudança significa na prática e fornecerá exemplos práticos de como isso se traduz no dia a dia de um gestor de projetos.

 

Das Entregas para o Valor: Entendendo a Mudança

Nas versões da metodologia anteriores ao PMBOK 7, o foco estava nas entregas do projeto, isto é, na entrega dos produtos, serviços ou resultados que o projeto tem por objetivo para fornecer. O plano baseava-se na sucessivas "milestones" de entregas parcelares até que, no final, todo o produto ou serviço que estava na base da elaboração do projeto era disponibilizado ao cliente. A ideia era que, ao entregar efetivamente esses produtos ou serviços, o projeto seria considerado um sucesso. 

Com o PMBOK 7 o centro "foco" do projeto mudou. As entregas por si só deixaram de ser o objetivo principal e o foco passou a estar no valor que, a cada momento, ou em cada uma dessas "milestones" o projeto entrega ao cliente.

Vejamos com mais de detalhe o que isso significa essa mudança de foco? Em termos simples, isso significa que, em vez de se concentrar apenas no que está sendo entregue, os gestores de projetos agora devem considerar o valor que essas entregas fornecem ao cliente do projeto. O valor pode ser definido de várias maneiras, mas geralmente se refere ao benefício ou à utilidade (para saber mais sobre o conceito economico de utilidade, leia o detalhe que é apresentado no final deste artigo) que algo proporciona. No contexto de um projeto, isso pode ser o impacto que as entregas do projeto têm sobre os objetivos estratégicos de uma organização, ou o grau em que eles satisfazem as necessidades ou desejos dos stakeholders.

Vamos considerar um exemplo prático para ilustrar essa mudança de foco. Imagine um projeto de desenvolvimento de software. Na abordagem orientada para a entrega, o sucesso do projeto seria medido pela entrega no calendário planeado, e conforme as especificações do software em causa. No entanto, numa abordagem orientada para o valor, os gestores de projetos teriam que considerar o valor que esse software proporciona. Isso poderia envolver perguntas como: O software atende às necessidades do usuário? Ele contribui para os objetivos estratégicos da organização? Ele oferece uma vantagem competitiva (leia no final uma breve explicação sobre o conceito de vantagem competitiva).

Um outro exemplo poderia ser um projeto de construção de uma nova instalação de produção. Na abordagem orientada para a entrega, o sucesso seria medido pela conclusão do edifício no prazo e dentro do orçamento. Na abordagem orientada para o valor, os gestores de projetos também teriam que considerar o valor que a nova instalação de produção proporciona. Isso poderia envolver perguntas como: A nova instalação aumentará a eficiência? Ela permitirá a produção de novos produtos? Ela contribuirá para a expansão em novos mercados?

Implicações desta Mudança de Paradigma para os Gestores de Projeto

A mudança de foco para o valor tem implicações significativas para os gestores de projetos. Ela exige que eles pensem mais estrategicamente e considerem o impacto mais amplo de seus projetos. Isso pode envolver:

  • A capacidade para gerirem a criação de estudos prévios de viabilidade (Business Case) que permitam justificar o potencial valor que o projeto aporta à organização. No paradigma atual orientado aos entregáveis, o gestor de projeto não se preocupa se o produto ou serviço que está a ser construido trás valor para a organização. Essa questão já ficou "resolvida" aquando dos processos de seleção dos projetos que a organização irá realizar.
  • Trabalhar de forma mais proxima com os stakeholders para entender as suas necessidades e expectativas, bem como a realização de análises de custo-benefício para avaliar o valor potencial das diferentes opções de projeto.
  • Adaptem as técnicas e ferramentas de gestão de projetos. Por exemplo, eles podem precisar usar técnicas de avaliação de valor, como análise de valor agregado (AVA), para rastrear e medir o valor que seus projetos estão proporcionando aos stakeholders e, principalmente, ao cliente do projeto.

Para quem é gestor de projeto há alguns anos e segue de perto a forma como a profissão tem evoluido, esta questão do Foco no Valor do produto ou serviço criado, em detrimento do Foco nos Entregáveis, deve fazer lembrar alguma coisa. A pergunta que deixo a todos os leitores é:

 

A mudança de paradigma do PMBOK 7, e em especial o principio orientador "Foco do Valor", onde é que já todos ouvimos falar disto?

 

 A resposta óbvia é: No AGILE.

 

Sim, a mudança de foco para o valor em vez de entregas no Guia PMBOK 7 é, de fato, uma adoção de um dos principais princípios das metodologias AGILE.

O AGILE é um conjunto de princípios e práticas de gerenciamento de projetos que enfatiza a colaboração, a flexibilidade e a entrega de valor ao cliente. Uma das principais diferenças entre o AGILE e as abordagens de gerenciamento de projetos mais tradicionais é justamente esse foco no valor.

No Manifesto AGILE, documento que está na base desta nova forma de gerir projetos, um dos quatro valores principais é "A resposta às mudanças mais do que seguir um plano". Isso significa que, em vez de se concentrar estritamente em seguir um plano de projeto e entregar produtos específicos, as equipes AGILE se concentram em se adaptar às mudanças para maximizar o valor para o cliente.

Ademais, o Manifesto AGILE também coloca o foco no cliente com o princípio de que "Nossa maior prioridade é satisfazer o cliente através da entrega contínua e adiantada de software de valor".

Dessa forma, o foco no valor é uma ideia central no AGILE. A mudança no PMBOK 7 para enfatizar o valor reflete uma maior aceitação dos princípios AGILE no campo do gerenciamento de projetos. O PMI, reconhecendo a popularidade e a eficácia das metodologias AGILE, integrou esses conceitos em sua estrutura, proporcionando um guia mais relevante e adaptável para os gerentes de projetos na atualidade.

Aliás, escrevi há bastante tempo um artigo sobre esse tema (Consulte-o aqui)

 

Conclusão



A mudança de foco do PMBOK 7 das entregas do projeto para o valor do projeto representa uma evolução significativa na gestão de projetos. Essa mudança reflete a crescente compreensão de que o sucesso de um projeto não deve ser medido apenas pelas suas entregas, mas também pelo valor que essas entregas proporcionam. Ao adotar essa abordagem orientada para o valor, os gestores de projetos podem ajudar a garantir que seus projetos não apenas entreguem resultados, mas que também proporcionem benefícios duradouros e significativos para os stakeholders e, principalmente, para o seu cliente.


Contudo é importante ressaltar que, embora o PMBOK 7 adote um foco no valor semelhante ao do AGILE, ainda existem diferenças entre as duas abordagens. O PMBOK continua a oferecer uma abordagem mais estruturada e abrangente para a gestão de projetos, enquanto o AGILE é mais flexível e adaptável. No entanto, a adoção de alguns princípios do AGILE pelo PMBOK mostra que, como é defendido desde há muito pela maioria dos gestores de projeto, essas duas abordagens podem ser complementares e não necessariamente opostas.

 

 

Tenham bons e bem-sucedidos, projetos.

Grp2ALL

 

Sobre os autores

 Todos os autores deste blogue são profissionais certificados em Gestão de Projetos com mais de uma década de experiência na área. Geriram, e continuam a gerir, vários projetos de sucesso nas mais diversas indústrias, atuam em vários países do mundo e partilham os seus conhecimentos e ideias através da escrita e do ensino.

 

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Conceito Económico de Utilidade:

"Utilidade" é um conceito fundamental em economia e refere-se à satisfação ou ao benefício que um indivíduo obtém de consumir um bem ou serviço.Por outras palavras, a utilidade é uma maneira de medir o quanto uma pessoa valoriza ou aprecia algo.

Na sua genese é um conceito bastante intuitivo. Os economistas utilizam-no para entender como os indivíduos tomam decisões de consumo. A ideia é que as pessoas procuram maximizar a sua utilidade total ao fazer escolhas sobre o que comprar e consumir.

A utilidade é fundamental na teoria do consumidor e na teoria da escolha racional, que são os alicerces da microeconomia. A Teoria da Utilidade Marginal, por exemplo, sugere que a utilidade que uma pessoa obtém ao consumir unidades adicionais de um bem ou serviço tende a diminuir.

Ora sendo os recursos das organizações algo que é por definição finito, as organizações devem implementar mecanismos de seleção racionais que lhes permitam garantir que afetam esses recursos escassos aos projetos que mais valor criam para a empresa, isto é, ao projetos que lhes irão trazer um maior acréscimo de utilidade
 

O que é uma Vantagem Competitiva:

"Vantagem competitiva" é um conceito económico que descreve a habilidade de uma entidade (seja uma pessoa, uma empresa, ou mesmo um país) de produzir bens ou serviços de maneira mais eficaz ou eficiente do que seus concorrentes. Uma vantagem competitiva pode advir de várias fontes, incluindo superioridade tecnológica, acesso a recursos naturais, capital humano de alta qualidade, eficiência na produção, ou mesmo uma forte marca.

No contexto do comércio internacional, o conceito de vantagem competitiva é frequentemente expresso através da teoria da vantagem comparativa. Esta teoria, proposta pelo economista britânico David Ricardo no século XIX, sugere que os países se beneficiam do comércio internacional, concentrando-se na produção de bens e serviços para os quais têm uma vantagem comparativa (ou seja, podem produzir a um custo menor, em termos de outros bens sacrificados, do que os seus parceiros comerciais).

No final do sec XX as vantagens competitivas voltaram à ordem dos dias muito por causa dos trabalhos do economista de da Harvard Business School, Michael Porter que ficou conhecido pelos seus estudos sobre estratégia de negócios e vantagem competitiva. Ele desenvolveu o "modelo das cinco forças", que as empresas podem usar para analisar o ambiente competitivo em sua indústria, e também destacou a importância da "cadeia de valor" na criação e manutenção de uma vantagem competitiva

 



 



  

 

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